quinta-feira, outubro 12, 2006

Entre a Vitrine e o Sonho.


Ele deu uma longa golada na cerveja, olhando pra mim, como se mergulhasse no meu corpo, de olhos bem abertos, conseguindo enxergar meu útero, minhas veias, artérias, os miolos efervescentes do meu cérebro; e degustasse o tempero misturado de tudo isso, junto à cevada.
Apoiou a latinha na arquibancada da arena, na praça dos arcos, sob a lua reluzente. E não olhava pra ela. Continuava mirando em mim, sem piscar.

Cada vez mais a pupila dele dilatava, e delatava o que sentia, enquanto sorria e passava a língua nos lábios - quase incontrolável ver aqueles lábios sem beijar, e querer sentir gosto de preliminar perfeita. - Entoou a voz de menino, tentou fazer grossa pra dar mais moral à barba de homem, querendo descobrir, carinho, pegada. Pegou forte meu braço, e perguntou quando nos conheceríamos de verdade.

A verdade dos navios que se cruzavam em guerra. Canhões, cólicas, crises convulsivas, vômitos, larvas e miasmas. Crianças gritando, panela chiando, televisão cantando Disney.


Meus olhos abriram, pesados.
Pare. A placa de trânsito bem na minha frente dizia: pare.

Os carros frearam; trânsito congelado. Só conseguia ver luzes, de todas as cores; faróis, lanternas, outdoors, os BR’s verde-amarelo dos postos de gasolina. Os meninos da Lapa não corriam mais pela arena, os pipocos de tiro do Morro dos Prazeres, e o batuque da fina flor do samba do outro quarteirão silenciaram, o trance estacionou, pick-ups desligadas, o burburinho amarelado da multidão-voz abafou, o orgasmo do casal atrás do carro; sem limite, nem medida.
Pessoas-estátuas, ali, com lágrimas-gargalhadas cristalizadas no rosto. Cervejas empedradas em copos vagabundos de plástico, cabelos plastificados refletiam o dourado das bolsas Louis Vuitton, que se misturavam aos meninos-dourados da rua. Sem medo.

Ele ainda olhava pra mim. Engoli o ar, e não me atrevi a pegar a latinha de cerveja pra desentalar o bolo vazio, que se instalou entre a garganta e meu peito. Não conseguia me mexer.
Evoquei todos os meus demônios. Queria ser inoculada por maldade.
Implorava uma tragédia que chamasse sua atenção.
Estalei os dedos, um a um. Comi os lábios, as carnes mortas do interior da boca. Olhei dentro dos olhos dele, tentando dizer;

Eu: resto de construção desmoronada, decadente. Sem possibilidade de restauração. Na maioria das vezes, termino meus dias no boteco da saída do túnel, implorando uma dose extra de vodka barata, fumando filtro de cigarro extra-forte, com filhos mortos de fome chorando na barra da saia.

Sim, amava todos os seus detalhes, percebia nele a configuração mais concreta do meu desejo.
Mas quando chegava perto, era como se apreciasse uma vitrine. Sintia meu coração pobre. E os demônios que evoquei eram mais que presentes.

terça-feira, outubro 03, 2006

novidades.

um novo espaço pra arte.

gostei da idéia de criar um multiply.
cinema.
bomsom.
literatura.

aqui, posto meus textos.
lá, posto textos de amigos queridos.
bons textos, claro!

disponibilizo boa música, e filmes.

http://joananict.multiply.com/

fiquem à vontade!

beijos.